quinta-feira, 24 de junho de 2010

Crime e Castigo.


 Súbito, Sônia estava ao seu lado. Aproximou-se sem ruído, sentou-se perto dele. O dia estava quase ainda no começo, e a frescura matinal fazia-se ainda sentir. Vinha vestida com a velha capa sovada e o xale verde. O rosto abatido, pálido, enfraquecido, conservava os vestígios da moléstia. Ela sorria ao prisioneiro com ar amável e feliz, todavia, conforme seu hábito, estendeu-lhe timidamente a mão.
Fazia sempre esse gesto com timidez. Às vezes abstinha-se dele com receio de ver repelida a mão, que ele parecia sempre aceitar com repugnância. Por vezes parecia mesmo aborrecido de vê-la e não abria a boca durante todo o tempo da visita. Em certos dias, ela tremia diante dele e deixava-o profundamente aflita.
Agora, porém, as suas mãos não podiam soltar-se.
Ele lhe lançou um rápido olhar, não proferiu palavra e baixou os olhos. Estavam só os odis, ninguém os podia ver. De repente, sem que o prisioneiro soubesse o por que, uma força invisível lançou-o aos pés da moça.
Pôs-se a chorar, abraçando-lhe os joelhos. No primeiro momento, ela ficou horrorizada, o rosto tornou-se-lhe mortalmente pálido. Deu um salto e fitou-o, tremendo, mas no mesmo instante tudo compreendeu.
Uma infinita felicidade irradiou-lhe dos olhos. Compreendia que ele a amava, sim, não podia duvidar. Amava-a infinitamente! O esperado minuto chegara afinal.
Queriam falar, contudo nenhuma palavra puderam proferir. Brilharam-lhes lágrimas nos olhos. Ambos estavam magros e pálidos , mas, nas pobres faces transtornadas, cintilava a aurora de uma vida nova, de uma ressurreição. Era o amor que os ressuscitava.
O coração de um continha uma fonte de vida inesgotável para o outro.

 Fiódor Dostoievski.

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