quinta-feira, 19 de maio de 2011


"Simplesmente ver Nys comer era inspirador. Ela sentia prazer em cada naco de comida, que selecionava com grande cuidado. Por cuidado não me refiro a qualquer preocupação com calorias e vitaminas. Não, era cuidadosa no sentido de escolher as coisas de que gostava e que combinavam com ela , porque lhe davam satisfação. (...) Uma boa refeição, uma boa conversa, uma boa foda - que maneria melhor de passar o dia? Não havia vermes devorando a sua consciência, preocupações que não pudesse jogar fora. Flutuar com a maré, era o que bastava. Não teria filhos, não faria nenhuma contribuição para o bem-estar da comunidade, não deixaria nenhuma marca sobre o mundo quando partisse. Mas, onde quer que fosse, tornaria a vida mais fácil, mais atraente, mais odorosa. (...) Queria eu também poder levar a vida da mesma maneira descontraída e natural. Às vezes, desejava ser uma mulher como ela, possuindo nada mais do que uma boceta atraente. Como seria maravilhoso botar a boceta da gente para trabalhar e usar o cérebro apenas para o prazer! Apaixonar-se pela felicidade! Tornar-se tão inútil quanto possível! Criar uma consciência tão dura quanto a pele de um crocodilo! E, na velhice, não mais atraente, comprar uma foda, se necessário. Ou comprar um cachorro e treiná-lo para fazer o que era preciso. Morrer, quando a hora chegasse, nua e sozinha, sem culpa, sem arrependimento, sem remorso..."

Henry Miller - Dias de paz em Clichy

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